amar, verbo intransitivo
Sempre fã de um bom modernista, o romance de Mário de Andrade me intrigou, antes de tudo, pelo título. “Amar, verbo intransitivo”. Eu amo, tu amas, ele ama, ponto final. De cara, me encantou a ideia do amor como um sentimento individual, que diz sobre o sujeito e, no infinitivo, mostra que é eterno, independe dos objetos que passam pelo predicado. E foi assim que eu, intrigada, fui atrás de descobrir mais sobre esse amor tão óbvio de Mário de Andrade, no qual eu nunca tinha pensado. E eu fui descobrindo, ao longo das quase 200 páginas, que a ideia do autor sobre esse nome que tanto me mesmerizava era outra.
O livro conta a história de Fraulein Elza, uma alemã que fugiu da Primeira Guerra e, no Brasil, tem um trabalho um tanto quanto estranho: ela é uma professora de amor! Contratada por uma família rica em Higienópolis, ela precisa cuidar de quatro crianças e, enquanto isso, tenta fazer o mais velho da família, Carlos, se apaixonar por ela. O narrador onisciente traz os pensamentos de Elza conforme cada momento seu com a família é friamente calculado, desde sua roupa até a maneira como ela ensina. Em cima disso, com algumas intromissões que passam a impressão de que estamos conversando com um amigo, esse narrador apresenta o contexto por trás das histórias e dos personagens. É aqui que aquele modernismo brilha. Entre piadinhas sarcásticas dignas de um revolucionário, perpassa um nacionalismo engraçadinho (com um fundinho de verdade que precisa ser aproveitado sem anacronismo), com alguns toques de profundidade e, aqui sim, uma verdadeira lição sobre o amor.
O que Mário de Andrade quis dizer, na verdade, quando deu nome a esse livro maluco, é que amor é coisa que se ensina. Com “eu amo, tu amas, ele ama” escrito num quadro negro, as conjugações ensinam as muitas formas que o amor pode tomar. Aqui, elas são meticulosamente ministradas em aulas premeditadas, e preciso reconhecer que não é isso que acontece na vida real, mas, de fato, aprendemos tudo que sabemos sobre o amor de maneira empírica. O livro me ensinou que amor é intransitivo também porque, mesmo que não seja eterno, o que aprendemos sobre ele fica conosco, independente do objeto. Colecionamos os aprendizados de amores e só assim, finalmente, aprendemos a amar.