Olhando para o cinema de maneira mais crítica

CINEMA PELO CINEMA

Acho que ninguém duvida do poder e da importância do cinema nas nossas vidas, especialmente depois do último ano, em que a presença da arte (e das telas) tomou proporções inimagináveis. E olha que coincidência legal: exatamente nesse mesmo ano, eu aprendi a gostar desses filmes de um jeito diferente. Eu comecei, aos pouquinhos, a entender que os filmes iam ao infinito e além, que tinha muito mais naquilo do que eu costumava ver. Hoje eu vim aqui falar dessas coisinhas em que eu aprendi a prestar atenção, mesmo que eu não seja, de nenhuma maneira, especialista no assunto. Assim, eis as minhas 10 dicas para mudar o seu jeito de assistir a um filme!

“I HOPE YOU ENJOY YOUR EXPERIENCE” – About Time (2013)

Essa é, provavelmente, a dica mais importante. Acontece que a minha parte favorita dos filmes é a magiquinha única que eles carregam: o jeito que eles tocam cada pessoa de maneira diferente, como eles fazem parte de tantas memórias de todos nós (pra mim, isso vai de sextas à noite com a minha irmã no sofá da sala à primeira vez que eu saí com o meu namorado – e até a brincar de fazer filmes com as minhas amigas quando eu era pequena). Como eles tiram a gente do nosso mundinho! E, o mais legal de tudo isso, é que nem sempre esses filmes são, no papel, bons. É importante entender isso: nem todo filme tá ali pra te fazer pensar ou analisar cada coisinha; às vezes eles só querem ser divertidos. Por isso, é imprescindível que você não deixe de aproveitar essa magiquinha dos filmes só em prol de ver uma coisa “melhor”. 

“WHY NOT? THEY’RE THE GREATEST” – West Side Story (1961)

É claro que é importante abrir o leque, assistir coisas diferentes — pra referência, eu comecei assistindo ao longa que ganhou o primeiro Oscar de melhor filme da história, em 1927. E essa é a segunda coisa sobre o que eu queria falar. Sabe aqueles filmes de que você sempre ouviu falar? Aqueles clássicos que você nunca viu? É um ótimo lugar pra começar! O negócio é que clichês são clichês por um motivo, e no cinema não é diferente. Isso vai de filmes (O Poderoso Chefão, Titanic, Clube da Luta, O Rei Leão..), até, por exemplo, atores (Ou você acha que o Jack Nicholson foi indicado ao Oscar 15 vezes à toa?) Afinal, se nos demos o trabalho de lembrar de nomes como “Casablanca”, “James Dean” ou “Audrey Hepburn” por décadas e décadas, tem que ter alguma coisa muito especial. Mas isso não se resume só a coisas velhas ou longas, ou aos “filmes-cabeça”; eu, por exemplo, acho que “Superbad” é um filme imperdível nessa saga de assistir aos grandes.

“IT’S ALL ABOUT CONTEXT” – Memento (2001)

É nessa parte que as coisas ficam diferentes. Eu vim descobrindo, ao assistir filmes, que o contexto de produção faz toda a diferença. Quando esse filme foi feito? Por quem? Onde? Para quem? Tudo isso muda como e qual mensagem está sendo passada; especialmente pra filmes velhos, isso pode mudar totalmente o jeito com que o filme é interpretado. Por exemplo, eu sou a maior fã de filmes de guerra, e todos nós sabemos que volta e meia sai um novo, mesmo que seja sobre uma história de 80 anos atrás. Mas, e os filmes feitos há 80 anos, que surgiram no meio de tudo isso? O exemplo mais clássico do que estou tentando dizer é “Casablanca”. O filme se passa durante a Segunda Guerra, nenhuma novidade aqui, mas o que o faz diferente é que ele também foi FEITO durante a Segunda Guerra. Isso quer dizer que toda a angústia que os personagens estavam passando pra gente na telinha era, de verdade, uma preocupação pra todo mundo por trás dela. Naquele filme, as pessoas estavam vivendo o que pra nós é história — fala sério, não tem como isso não ser o máximo!! Por isso, olhando esse contexto de produção, entendemos o porquê de certos assuntos ou pessoas serem abordados de determinada forma. Por exemplo, se você for reparar, muitas das produções de Hollywood do final do século XX colocam personagens russos como os Grandes Vilões, isso tudo por conta da Guerra Fria. São esses detalhezinhos, que só vêm à tona quando você entende o contexto de produção, que começam a mudar a sua visão sobre os filmes.

“LOOK AT HIS USE OF COLOR HERE, ISN’T HE GREAT?” Titanic

Eu não consigo contar nos dedos o número de vezes que me zoaram por ficar comentando sobre as cores dos filmes a que eu assistia. Sim, as cores. Minha fixação com isso começou na primeira vez que eu assisti a La La Land (que é um dos meus filmes favoritos), e agora eu simplesmente não consigo deixar de pensar nesse aspecto. O que eu quero dizer é que, assim como os personagens e as falas, as cores de um filme também contam uma história. Por exemplo, em “Tenet”, o vermelho mostra que o tempo está seguindo seu fluxo natural, enquanto o azul nos avisa que o tempo está invertido, e assim as simples cores de cada cena ajudam a gente a se situar melhor — coisa que, nos filmes do Christopher Nolan, é sempre bem-vinda. Agora, num exemplo bem mais simples, pensem em filmes de criança: os personagens SEMPRE têm cores definidas. A Mônica é vermelha, o Cebolinha é verde e a Magali, amarela. Em Lazy Town, o Sportacus é azul, a Stephanie é rosa e o Robbie é roxo. E, no ápice disso tudo, pensa nos Power Rangers. É claro que isso não é à toa… é só mais um detalhezinho pra se prestar atenção, que tem toda uma nova história escondida por trás.

“YOU CAN PRACTICALLY HEAR EVERY NUANCE OF EVERY INSTRUMENT” – American Psycho (2000)

Você já viu um filme de terror no mudo? Eu te garanto que perde a graça…  É isso que as músicas nos filmes fazem: elas nos dizem o que sentir, sem que a gente perceba. Por isso mesmo, muitas vezes acabamos deixando esse detalhe passar. Sabe aquelas sextas-feiras que eu disse que passo vendo filmes com a minha irmã? Numa dessas, ela chegou à melhor conclusão de sua vida: filmes ficariam melhores com músicas de circo. Eu tentaria descrever o pensamento dela aqui, sobre como os “tralalás” encaixam com os tiros, mas as genialidades da minha irmã vão ter que ficar pra outra hora. O meu ponto com isso é que, se eu pegasse uma cena de um filme de guerra e colocasse uma música de circo por cima, essa cena se tornaria outra. Eis um bom exemplo disso: “Bastardos Inglórios”. Ao invés da ideia da minha irmã, Tarantino decidiu encher seu filme com músicas barulhentas, rápidas e fortes, contrastando imensamente com as melodias mais “sóbrias” que tendem a dominar quando o assunto é tão sério quanto uma guerra mundial. E, só assim, a trilha acaba virando um espetáculo à parte. Mais uma referência, sabe “Uma Linda Mulher”? Originalmente, a ideia era que ele chamasse “$3.000”, e decidiram mudar só por conta da música de Roy Orbison. Quer mais que isso? “Shallow” e “Nasce uma estrela”, “Livre estou” e “Frozen”, “All Star” e “Shrek”. Esses filmes não seriam o que são sem as músicas. 

“THERE ARE CAMERAS EVERYWHERE” – Gone Girl (2014)

Eu não estou falando daquelas raras vezes em que a gente consegue enxergar um reflexo ou um pedacinho de uma câmera no meio do filme (cof cof High School Musical cof cof). Eu estou falando da maneira como cada cena foi gravada. O que vemos nas telas é um só um dos infinitos ângulos sob os quais a história podia ser contada, e isso é muito bem pensado. Quando o personagem está sendo filmado de baixo para cima, isso dá pra ele um ar de superioridade, do mesmo jeito que, filmando o personagem de cima pra baixo, ele parece “menor”. Em “Vertigo”, um filme de 1958, Hitchcock decidiu aproximar a câmera do ator enquanto, ao mesmo tempo, diminuia o zoom. Isso criou um efeito em que o personagem parecia ficar parado na frente de um fundo que se mexia, o que ficou conhecido como o efeito vertigo e é uma marca do suspense no cinema até hoje. Quando você começa a reparar nessas coisinhas, fica clara a diferença que elas fazem no produto final.

“IN FEATURE FILMS, THE DIRECTOR IS GOD” – Alfred Hitchcock

Falando no Hitchcock, eu não posso deixar de ressaltar o papel dos diretores nos filmes. Essa foi uma das primeiras coisas em que eu comecei a reparar, exatamente por fazer uma diferença tão gritante. Sabe como as capas de livros do mesmo autor tendem a seguir um mesmo estilo? Com diretores é a mesma coisa. São eles que determinam o estilo do filme que estão fazendo e, inevitavelmente, deixam sua marca. O Scorsese tem filmes longos demais; se você decidir assistir a Tarantino, esteja preparado pra matança que vem; o Christopher Nolan tem um relacionamento extremamente complicado com o tempo: esteja pronto pra ver os créditos sem entender nada; o David Fincher vai brincar com a sua cabeça até você se perder; e o Woody Allen vai fazer o mesmo com o seu coração. Sabe as cores sobre as quais eu falei? Escolha um filme do Wes Anderson e você vai ver que ele trabalha com isso como mais ninguém. Eu posso continuar aqui pra sempre, citando marcas e mais marcas registradas de cada um desses diretores, mas é simples assim. O filme é deles e é a eles que nós vamos assistir.

“SILENT PICTURES ARE YESTERDAY’S NEWS, SO I FIGURE WE GOTTA RESHOOT HELL’S ANGELS FOR SOUND” – The Aviator (2003)

Não é segredo pra ninguém que tenha chegado até aqui que eu sou apaixonada por falas e frases de filmes, mas uma coisa que eu aprendi, conforme eu me apaixonava por elas, foi a prestar atenção também no silêncio, nas rubricas e em tudo mais que o roteiro envolve. Num exemplo descarado disso, existem 25 linhas de diálogo no filme “Um Lugar Silencioso” inteiro. Nas 3 horas e meia de filme. E, se você acha que isso é pouco, imagine as primeiras décadas do cinema, durante as quais os roteiros não contavam com fala nenhuma. Tudo isso deixa claro que, desde o começo dessa história, tem muito mais que palavras escritas nesse roteiro. Ok, nem sempre esses silêncios são feitos da melhor maneira — “After” que o diga — mas, se tudo for feito com cuidado, até uma pausa pra respirar no meio de uma fala quer dizer muito também 

“YOU WILL FORGIVE ME MY CURIOSITY, MR. BLAINE” – Casablanca (1943)

Você sabia que a Katherine Hepburn, pessoa que mais ganhou Oscars de melhor atriz da história, nunca foi receber um prêmio? E que a primeira ideia era que a Gwyneth Paltrow fosse a Rose em Titanic? E que, no filme “American Psycho”,  a cena em que o detetive entrevista Patrick Bateman foi gravada três vezes: uma como se ele soubesse que Pat era o assassino, uma como se ele soubesse que não era e uma como se ele não tivesse certeza, e a cena final mistura cortes de todas essas vezes, deixando o espectador sem entender a opinião real do detetive? A Laura sempre diz que eu pareço um almanaque, pelas coisas mais aleatórias que eu sei, e é exatamente por causa dessa dica aqui. Curiosidade, aqui, é a melhor coisa que pode te acontecer. Falas clássicas da história que foram improvisadas, atores que recusaram chances de uma vida por filmes de que ninguém se lembra ou até o porquê de filmes passarem tanto tempo no papel. É só jogar o filme no Google e você vai ver, essas curiosidades deixam a experiência do filme sempre mais interessante.

“COME OVER HERE KID. LEARN SOMETHING” – The Godfather (1972)

É com essa que vou me despedir. A minha última dica é que descobertas novas sobre filmes podem vir de qualquer lugar. Outro dia, eu estava assistindo a “Jane: the Virgin” e ela comentou sobre três passos para criar suspense numa cena. Eu nunca tinha reparado naquilo antes mas, desde então, já reconheci a “regra” em vários dos filmes a que eu assisti. Assim, do nada. E é isso! Simples assim, foi prestando atenção nesses detalhes que eu mudei o meu jeito de ver filmes e me apaixonei cada vez mais por eles. Espero levar todo mundo a se apaixonar mais um pouquinho por isso também!

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